O mundo vem sofrendo grandes transformações sociais, tanto em inovações tecnológicas, econômicas, como demográficas. Nesse contexto, o envelhecimento observado pelo prisma do aumento demográfico, a projeção que se faz para 2050 que a população idosa será de cerca de 2 bilhões de pessoas. Este número traduz a profunda alteração populacional que se registra em todas as regiões do planeta. Nesse contexto, o Brasil apresenta uma perspectiva de crescimento deste grupo de pessoas para as próximas décadas, devendo atingir 41,5 milhões, em 2030, e 73,5 milhões, em 2060. As causas diretas desta evolução se vinculam à melhoria das condições de vida e ao progresso da medicina, todavia, ainda permanecem os grandes e primários problemas sociais, como a miséria de grande parte da população do planeta. A desigualdade social é o principal desencadeador de situações de vulnerabilidade e riscos sociais de grandes contingentes populacionais minoritários como os idosos. Assim sendo, o Brasil por sua vez, apresenta uma população em processo acelerado de envelhecimento, se pode atribuir a isso, nos últimos tempos, à melhorias da qualidade de vida, e o acesso as políticas públicas de saúde e de assistência social, no entanto, ainda persistem a discriminação e a violência, principalmente para essa faixa etária, pois, é visto como “um fardo”, muitas vezes necessita de cuidados da família e, na ausência desta, da presença do estado na oferta de acolhimento e atenção durante esse período de vida. Portanto, é preciso discutir e repensar a inserção de pessoas no processo de envelhecimento nesse novo contexto de longevidade, pensando em alternativas que garantam a autonomia de vida com saúde e, para aqueles que necessitam, alternativas de cuidados que lhes garantam qualidade de vida.
The world has been undergoing major social transformations, both in technological, economic and demographic innovations. In this context, aging observed through the prism of population increase, the projection made for 2050 that the elderly population will be around 2 billion people. This number reflects the profound population change that is registered in all regions of the planet. In this context, Brazil presents a perspective of growth of this group of people for the next decades, which is expected to reach 41.5 million in 2030 and 73.5 million in 2060. The direct causes of this evolution are linked to the improvement of living conditions and the progress of medicine, however, the great and primary social problems still remain, like the misery of a large part of the planet's population. Social inequality is the main trigger of situations of vulnerability and social risks of large minority population groups like the elderly. Therefore, Brazil, in turn, has a population in an accelerated process of aging, this can be attributed, in recent times, to improvements in the quality of life, and access to public health and social assistance policies, however, discrimination and violence still persist, especially for this age group, because it is seen as "a burden", and often needs care from the family and, in the absence of the latter, the presence of the state in offering care and attention during this period of life. Therefore, it is necessary to discuss and rethink the insertion of people in the aging process in this new context of longevity, thinking about alternatives that guarantee the autonomy of life with health and, for those in need, alternatives of care that guarantee quality of life.
Introdução
O mundo vem sofrendo grandes transformações sociais, tanto em inovações tecnológicas, econômicas, como demográficas. Nesse contexto, o envelhecimento observado pelo prisma do aumento demográfico, a projeção que se faz para 2050 que a população idosa será de cerca de 2 bilhões de pessoas. Este número traduz a profunda alteração populacional que se registra em todas as regiões do planeta. Nesse contexto, o Brasil apresenta uma perspectiva de crescimento deste grupo de pessoas para as próximas décadas, devendo atingir 41,5 milhões, em 2030, e 73,5 milhões, em 2060.
Em uma sociedade que privilegia o novo, o moderno, não há espaço para o “velho”, “ultrapassado”, afinal, na sociedade "líquida" aquele que não serve mais para aumentar o lucro do capital passa a ser considerado “refugo”, depois de exaurida toda sua energia pela exploração da sua força de trabalho. Segundo Simone Beauvoir, a sociedade é ambígua quando se trata de não encarar a velhice como uma fase nitidamente marcada, como acontece na transição da fase da adolescência para a fase adulta, onde a faixa entre 18 e 21 anos indica que esses jovens são aceitos na sociedade dos homens, essa promoção de destaca como um “rito de passagem”, o que não acontece com o idoso, pois “o momento em que começa a velhice é mal definido, varia de acordo com as épocas e lugares, não se encontram em parte alguma “ritos de passagem” que estabeleçam um novo estatuto (Beauvoir, 2018: 7).
Assim, em um contexto sócio histórico que valoriza a juventude, "a velhice aparece como uma espécie de segredo vergonhoso, do qual é indecente falar” (Beauvoir, 2018: 6). Isso pode ser revelado pela escassa literatura que trata da questão do envelhecimento, contrapondo o grande volume de temas que tratam das temáticas da mulher, da criança e do adolescente, a temática sobre o idoso só aparece quando se trata de estudos especializados. A autora, em sua obra sobre a velhice, era questionada, ouvia comentários: “Que ideia!... Mas você não é velha!... Que tema triste...”, o que contra argumenta que escrevia sobre velhice, justamente “para quebrar a conspiração do silêncio” (Beauvoir, 2018: 7).
O Brasil, até bem pouco tempo, voltou a se preocupar com a questão do envelhecimento da sua população, apenas pelo fato do que estava resultado dessa demanda em onerar os serviços públicos de saúde. A luta da sociedade para pensar em mecanismos de proteção e atenção às pessoas idosas foi uma luta travada por mais de quatro décadas. Mesmo considerando o marco da Constituição Federal de 1988, ainda assim, somente em 1994 – Política Nacional do Idoso – e, finalmente em 2003, foi aprovada a Lei que normatiza o atendimento às pessoas idosas, no país.
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O Índice de Envelhecimento no Brasil e no mundo. https://www.portaldoenvelhecimento.com.br/o-indice-de-envelhecimento-no-brasil-e-no-mundo/. Acesso em 31 de maio de 2021
O mundo tem vivenciado um crescente aumento da população idosa, mas “o Brasil terá um dos processos de envelhecimento populacional mais intensos e rápidos do mundo”1, esse crescimento ocorre pelo baixo índice de fertilidade, pois o número de nascimentos vem se reduzindo paulatinamente. Outro fator é, nos últimos tempos, as conquistas para o acesso às políticas públicas, principalmente saúde e assistência social, essa última, com acesso a renda que dá relativa autonomia às pessoas idosas, que muitas vezes, acabam sendo o provedor da família.
No entanto, estamos vivendo um retrocesso em relação aos direitos sociais de todos/as brasileiros/as, pelo fato de que houve recentemente, sob o pretexto que a previdência social é que era responsável pelo déficit nas contas públicas, a reforma da previdência, alterando não só a idade limite para se aposentar, mas também dificultando e limitando o acesso aos benefícios sociais, principalmente das mulheres, pobres e idosas, atingindo aquelas que por muito tempo terem se dedicado aos cuidados da família não terão acesso a previdência na velhice.
O texto tem por objetivo refletir sobre o processo de envelhecimento no mundo contemporâneo, abordando a velhice como uma categoria social, bem como o contexto sócio histórico que vem sendo investigado desde o início do século XX, apenas relacionado à medida que a pessoa envelhecia até atingir a senescência. Chegando até os tempos contemporâneos onde o período de longevidade faz com que as pessoas vivam mais, por um lado, por outro, idosos que sofrem de males incapacitantes e necessitam de cuidados da família ou do Estado quando esse idoso perde sua autonomia e a família já não lhe presta os cuidados que deveriam.
Na sequencia se fala da construção de legislação que objetiva promover a proteção de pessoas na “terceira idade”, com um período recente de luta da sociedade civil, no entanto, na prática, essa garantia prevista legalmente está longe de ser efetivada, visto que essa preocupação com as pessoas idosas ocorreu devido aos impactos econômicos causados nos sistemas de assistência social e saúde, pois devido à ausência de sistema de proteção que atenda as necessidades dessas pessoas, cada vez mais, passaram a ser atendidos pelo estado, por conta de que essas pessoas ao longo da vida não tiveram acesso ao trabalho formal que lhes garantisse um recurso financeiro para quando chegassem a velhice.
Velhice: uma categoria social
O envelhecimento, ou senescência, é um processo universal, determinado geneticamente para os indivíduos da espécie. As primeiras investigações sobre o envelhecimento do início do século XX, relacionavam-se basicamente às modificações fisiológicas e perdas de sistemas vitais do organismo, que ocorriam à medida em que o indivíduo envelhecia e atingia os anos da senescência. Entretanto, o progresso social, econômico e tecnológico de vários países da Europa ocidental e nos Estados Unidos, regiões onde a ciência do comportamento humano primeiro se estabeleceu, deu origem ao aumento no número de idosos ativos, saudáveis e envolvidos socialmente, em lugar de idosos doentes, apáticos, incapacitados e que morriam cedo, até então predominantes. De modo paralelo, o crescimento do contingente de idosos com maior poder político produziu condições para que pesquisadores de várias áreas, entre as quais a psicologia, passassem a investir mais na pesquisa e na intervenção desse segmento. Nesse sentido, volta-se a atenção para a pluralidade da categoria velhice, não só pela comprovação da pluralidade de formas de envelhecer dentro do mesmo grupo etário, mas por haver vários grupos etários dentro desta denominação genérica de velhice. Desse modo, os princípios científicos vigentes não explicavam mais o fenômeno que se observava nas ruas, nas instituições sociais nas universidades (Neri, 2004).
Em tal contexto, as teorias de estágios de desenvolvimento humano apresentavam condições para observar os seus pressupostos teóricos, em parte porque não explicava, satisfatoriamente, as fases do desenvolvimento posterior à adolescência, ou não contemplava a velhice, muitas destas abordagens entendiam que nas experiências infantis estariam a base psicológica para os anos seguintes, a personalidade do indivíduo já estaria definida até os anos da adolescência. Assim, um dos desafios enfrentados pela psicologia do envelhecimento estava nos conceitos de desenvolvimento e envelhecimento, tradicionalmente tratados como antagônicos, uma vez que biologicamente, “o desenvolvimento inclui processos de crescimento ou maturação, organização e diferenciação, tendo como ápice a capacidade de reproduzir a espécie. Ao contrário, o envelhecimento biológico é um processo gradual de declínio em estrutura, função, organização e diferenciação, cujo ponto final é a morte” (Neri, 2013, p.20). Sendo assim, as mudanças sócio-histórica determinaram a constituição da velhice como categoria social e contextualizaram a emergência de novos paradigmas na construção das teorias psicológicas de desenvolvimento, enfatizando-se a importância histórica do contexto social e cultural para o desenvolvimento de indivíduos e de grupos etários.
Na contemporaneidade, o envelhecimento humano passou a ser considerado um importante fenômeno social, aumentando o interesse em pesquisas sobre o tema. Isso decorreu, sobretudo, do aumento acelerado da população acima de 60 anos em relação à população geral. Segundo o Departamento de Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas a população com 60 ou mais anos passou de 9,2% em 1990 para 12,3 em 2015. Em 2030 prevê-se que a população idosa seja cerca de 1 400 milhões, representando 16,5 % a nível mundial (Amaro, 2015). Contudo, a situação demográfica atual é muito diversa de país para país e até dentro de cada país. No Brasil, na contagem total da população, pessoas com 60 anos ou mais – apresenta “um aumento de 4% em 1940 para 11% em 2010. A expectativa é de que este grupo, formado por 20,6 milhões de pessoas em 2010, venha a ser constituído por 57 milhões em 2040 e fique responsável por aproximadamente 28% da população brasileira”(Camarano, Kanso e Fernandes, 2013:7).
O envelhecimento populacional é considerado uma das principais conquistas sociais da segunda metade do século XX, no entanto, essa conquista traz grandes desafios. Um deles, é assegurar e garantir a dignidade humana e a equidade entre os grupos etários acesso aos recursos, direitos e responsabilidades sociais. O aumento da população nesta faixa etária, traduz uma profunda alteração demográfica que está a ser registada em todas as regiões. Esta alteração se deve a redução da fecundidade e da mortalidade, resultado de políticas públicas e de incentivos, amparados pelo progresso tecnológico e médico.
Em consequência, o declínio da fecundidade acarreta, a médio e longo prazos, uma redução da população nas idades produtivas (trabalhadores, potenciais contribuintes e cuidadores). Já a diminuição da mortalidade nas idades avançadas resulta em um aumento no número de anos vividos pelos idosos. Embora seja uma conquista, nem todas as visões sobre esse fenômeno são positivas, têm sido vistas com preocupação, pois implicam mudanças no padrão de transferência de recursos públicos e privados. A questão do envelhecimento populacional entra na agenda das políticas públicas como um problema de déficit, por se tratar do crescimento relativamente acelerado de um contingente populacional considerado inativo ou dependente, simultaneamente ao encolhimento daquele em idade ativa ou produtiva.
O acesso às políticas públicas de assistência social à população idosa
Não há o estabelecimento de uma práxis quando se trata de operacionalizar o que está plasmado na legislação e o que é vivenciado na prática, quando se operacionaliza a política pública de atenção às pessoas idosas, isso pode perfeitamente ser constatado quando se acessam dados referentes às diversas formas de violência que sofrem quando atingem a idade que se insere na categoria social, velhice.
Da mesma forma, não se pode falar de acesso a política pública de assistência social de forma isolada, visto que desde a Constituição Federal de 1988, previdência, saúde e assistência social, compõem o tripé da seguridade social brasileira. Entendendo que o acesso a política pública de assistência social não é universal, ou seja, conforme o Art. 1º da Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS:
A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas. (BRASIL, 1993).
Assim, é para quem dela necessitar e é regulada como assistência complementar, dentro outros: [...] aposentadoria por velhice[...], se pode inferir que o acesso a política pública de assistência social, se dá em um espaço de contradição entre o que realmente é necessário e o que é oferecido como direito, pois “com efeito, o sistema previdenciário prometeu sempre mais do que efetivamente ofereceu” (SILVA, 2008: 17). Considerando inclusive, que a assistência social se destina originalmente para os trabalhadores pobres tidos como incapazes para o trabalho, de forma geral “idosos, pessoas com deficiência e crianças” (Boschetti, 2003: 62).
A limitação do acesso se dá justamente pelo fato de que não é para todos, mas sim “para os desamparados”, essa condição recai sobremaneira naqueles trabalhadores que, ao longo da vida, não puderam contribuir com o sistema da previdência e, ao chegar na velhice o que lhe é dito como direito é o acesso é o benefício assistencial , visto que esse trabalhador teve suas forças produtivas exauridas pelo capital e é colocado como “refugo” , estabelecendo uma tensão entre trabalho e assistência “assim, mesmo quando reconhecidos como direitos sociais, vivem uma contraditória relação de tensão e atração”(Boschetti, 2003: 47).
Dessa forma, esse trabalhador que sempre se viu excluído do mercado de trabalho com garantias trabalhistas que pudessem prover seu sustento e de sua família quando precisasse de assistência, não teria acesso, ao não ser o mínimo, acarretando uma tensão levada ao extremo, segundo Castel (1998) pode conduzir a pior das servidões, pois, segundo ele: “a liberdade sem proteção pode levar à pior servidão: a da necessidade” (Boschetti, 2003: 47).
Portanto, envelhecer no contexto da sociedade capitalista deve ser problematizado como uma expressão da questão social e que, está diretamente relacionada com a questão do trabalho, “pois o(a) trabalhador(a) idoso(a), que vivenciou durante toda a vida a exploração no mundo do trabalho, continuam vivenciando os reflexos da desigualdade social”. Dessa forma, para esse trabalhador que está no processo de envelhecimento, envelhecer impacta no “selo distintivo da atividade humana”, o trabalho, pois é por meio dele que supre suas necessidades e também, gera outras necessidades (Soares, 2018: 4).
Não bastasse esses rebatimentos no momento em que se deveria ter a proteção social para viver dignamente, o trabalhador idoso enfrenta as sucessivas ameaças com as ditas reformas que, sob pretexto do crescimento da população idosas e com o argumento de reduzir os gastos públicos, afirmando que, com isso, contribui para o crescimento econômico do país, sendo este o grande desafio para o século XXI, pois com o crescimento de pessoas idosas, a baixa taxa de fecundidade, a tendência é o crescimento ainda maior de trabalhadores nessa faixa etária.
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Com envelhecimento, cresce número de familiares que cuidam de idosos no país. https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/27878-com-envelhecimento-cresce-numero-de-familiares-que-cuidam-de-idosos-no-pais. Acesso em 07 de junho de 2021
O Brasil viverá um crescimento de trabalhadores idosos de forma intensa e rápida, superando outros países, segundo a ONU, o Índice de Envelhecimento para o mundo apresenta números crescentes, sendo que no período de 1950 e 2100, no país, em 1950 havia somente 11,7 idosos de 60 anos e mais, para cada 100 jovens de 0 a 14 anos na população brasileira, apresentando assim, os jovens como ampla maioria na estrutura etária, mas vem se alterando desde então. Assim, em 2030, teremos um país de idosos, considerando a faixa etária de 60 anos e mais e, portanto, essa estrutura envelhecida será apresentada em 2038, com pessoas na faixa etária de 65 anos, com elevado número também, de pessoas na “quarta idade”, ou seja, idosos com 80 anos em maior número do que jovens de 0 a 14 anos, esse fator vai trazer grandes desafios quanto ao sistema de proteção social, previdência, saúde e assistência social, sem considerar o impacto na ambiente familiar, pois muitos terão que se afastar do trabalho para cuidar do seu familiar idoso, segundo estudo do IBGE2, “mais de 5 milhões de pessoas se dedicaram a cuidados de parentes idosos no ano passado (2019), saltando de 3,7 milhões em 2016 para 5,1 milhões em 2019.
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A Covid-19 é uma doença infecciosa causada pelo coronavírus 2 da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) (abreviado para SARS-CoV-2, do inglês Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2), que apresenta amplo espectro clínico, com manifestações respiratórias, digestivas e sistêmicas1. O vírus possui alta transmissibilidade e provoca uma síndrome respiratória aguda que varia de casos leves – cerca de 80% – a casos muito graves com insuficiência respiratória – entre 5% e 10% dos casos. Sua letalidade varia conforme a faixa etária2. https://docs.bvsalud.org/biblioref/2020/05/1096174/plasmaconvalescente-covid19.pdf. Acesso em 22 de maio de 2021.
A tendência, devido ao COVID 193, é crescer esse número de afastamento para cuidar de parentes idosos, considerando o crescimento de pessoas no processo de envelhecimento. O estudo realizado pelo Instituto por meio da Pesquisa Nacional por amostra de Domicílio Contínua (PNAD-C 2019), revela outros dados que devem ser considerados, indica que os estados que mais pessoas são cuidadores é no Rio Grande do Norte e o menor número é apresentado pelo estado do Acre, sendo esse cuidado realizado dentro de domicílio.
Para efeitos de comparação que comprova esses dados crescentes, Minayo (2002), em estudo sobre o envelhecimento, demonstrava que havia dobrado o nível de esperança de vida em poucas décadas, em contraposição aos países europeus que levaram cerca de 140 anos para envelhecer, pois,
A esperança de vida ao nascer dos brasileiros era de 33,7 anos em 1900; 43, em 1950; 65, em 1990; chega a quase 70 anos na entrada do novo século; e prevê-se que ultrapasse os 75 anos em 2025. De 1950 a 2025 terá crescido 15 vezes, quando o restante da população terá conseguido um incremento de 5 vezes. Apesar de todo esse incremento, a maioria das pessoas nessa faixa etária está entre os 60 e os 69 anos, constituindo ainda menos de 10% da população total (Veras, 1995), quando na Europa, por exemplo, são as faixas acima de 70 anos as que mais crescem. No entanto, um país já é considerado ‘velho’ quando 7% de sua população são constituídos por idosos (Minayo, 2020: 12).
A prospecção se confirma, visto que é crescente o número de pessoas acima de 60 anos no Brasil, aumentando, portanto, os desafios para as políticas públicas que, nos últimos tempos sofreram ataques por parte do estado, destituindo direitos duramente conquistados pelos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras.
Políticas Públicas de Saúde do Idoso no Brasil
No Brasil, as políticas públicas de saúde voltadas à população idosa surgiram como prioridade no Pacto pela Vida em 2006, concomitante com a aprovação da Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI). O Pacto pela Vida tem como uma das prioridades, articuladas e integradas, o compromisso público dos gestores do SUS na construção do Pacto pela Saúde. A saúde do idoso faz parte dessa prioridade, ao requerer a atenção integral e a implementação da PNSPI, também evidenciam que a preocupação com os aspectos demográficos que envolvem o envelhecimento da população brasileira é recentes e emergiu após a análise do aumento dos gastos públicos sociais, dentre eles de saúde dispensados a esta faixa populacional (BRASIL, 2006a; BRASIL, 2006b).
A PNSPI conta para a execução de suas diretrizes com o Sistema Único de Saúde (SUS), por meio das equipes de Estratégias de Saúde da Família para a Assistência Básica de Saúde, Hospitais Gerais e Centros de Referência à Saúde do Idoso, enquanto pontos de atenção. A atual redação, versa que a finalidade primordial da PNSPI é “recuperar, manter e promover a autonomia e a independência dos indivíduos idosos, direcionando medidas coletivas e individuais de saúde para esse fim, em consonância com os princípios e diretrizes do SUS” (BRASIL, 2006a).
A PNSPI apresenta as seguintes diretrizes:
a) promoção do envelhecimento ativo e saudável; b) atenção integral, integrada à saúde da pessoa idosa; c) estímulo às ações intersetoriais, visando à integralidade da atenção; d) provimento de recursos capazes de assegurar qualidade da atenção à saúde da pessoa idosa; e) estímulo à participação e fortalecimento do controle social; f) formação e educação permanente dos profissionais de saúde do SUS na área de saúde da pessoa idosa; g) divulgação e informação sobre a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa para profissionais de saúde, gestores e usuários do SUS; h) promoção de cooperação nacional e internacional das experiências na atenção à saúde da pessoa idosa; e i) apoio ao desenvolvimento de estudos e pesquisas (BRASIL, 2006a, np).
Atualmente, o país apresenta uma crescente perspectiva de envelhecimento populacional, conforme demonstram os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), onde divulgam que até 2025, o Brasil será o sexto país do mundo com o maior número de pessoas idosas (OMS, 2005). Brasil (2014) contabiliza mais de 20 milhões de pessoas com 60 anos ou mais e apresenta uma perspectiva de crescimento deste grupo populacional para as próximas décadas, devendo atingir 41,5 milhões, em 2030, e 73,5 milhões, em 2060. Tal fato apresenta-se como um grande desafio quanto às políticas de saúde voltadas para a garantia de preservação da saúde, da qualidade de vida e da assistência dos agravos que os acometem.
Frente às mudanças do cenário da população idosa no Brasil, que ao longo de muitos anos contou com a preponderância de jovens, suscitou a necessidade de repensar as novas demandas, oriundas da situação populacional e epidemiológico, a fim de acalorar a discussão sobre o envelhecimento, visando a avaliação das políticas públicas de atenção à saúde do idoso, sua efetividade para contribuir e aperfeiçoar as ações de proteção e assistência destinadas a eles (Damasceno; Souza, 2016).
Zen et al (2018) destaca que a maior parte dos idosos brasileiros convive com doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e, alguns, com limitações funcionais, originados das transformações de prevalência da mortalidade no Brasil, que compreendia agravos comuns a população jovem para uma realidade de patologias complexas e onerosas, características dos países longevos, predominantemente por doenças crônicas e múltiplas que persistem por anos, com necessidade de assistência pelos serviços de saúde, como maior frequência ambulatorial, dispensação de medicação contínua e exames periódicos.
Para além das modificações impelidas nos quadros demográficos e epidemiológicos, há de se considerar ainda um conjunto de realidades, próprias da inserção dos idosos na sociedade moderna, sendo elas, capazes de contribuir para o surgimento ou agravamento de enfermidades, fazendo com que haja maiores demandas, não somente no setor da saúde, mas também em outras áreas (Dantas et al., 2017).
Nos contextos supracitados, o Sistema Único de Saúde (SUS) é seguramente afetado, acarretando fortes impactos em todos os níveis de atenção, considerando o sucateamento dos serviços, que ainda apresentam lacunas quanto aos princípios de universalidade, equidade e integralidade que o norteia, assim como aspectos relacionados aos vazios geográficos na oferta dos serviços de média e alta complexidades, portanto o enfrentamento das morbidades que serão ainda mais presentes com o aumento do número de pessoas idosas. Contudo, urge a necessidade de reestruturação de fontes de financiamento e processos de gestão na área da saúde, a fim de confrontar de maneira adequada as questões associadas à maior longevidade da população e ao funcionamento do sistema como um todo (Oliveira, 2016; Medeiros; Coura; Ferreira, 2017).
Medeiros et al (2017), em seu artigo sobre as repercussões da elevação da população idosa na saúde pública, ressaltam que o aumento deste contingente, não significa um problema, em si, visto que pode representar um indicador indireto do nível de desenvolvimento de uma nação. Porém, os efeitos em vários setores da sociedade, especialmente, nos serviços de saúde, trazem desafios aos países, dentre eles o Brasil. O autor enfatiza questões do cotidiano da prática assistencial, sobretudo as que se referem a associação entre os idosos e a dependência física, que interfere na autonomia dessas pessoas profundamente, exigindo maior atenção em saúde. Este contexto está intimamente relacionado ao perfil de morbidades, incapacidades e sequelas, internação hospitalar prolongada, aumento da frequência de reintegrações, bem como recuperação mais lenta; fatos que repercutem de diversas maneiras na vida dos idosos, familiares e profissionais de saúde responsáveis pelos cuidados. Também há de se ressaltar a elevada demanda de recursos para o SUS, que já tem como barreira às questões relacionadas ao financiamento.
O aumento da expectativa de vida e consequentemente a elevação do número de idosos abriu portas para pensar as dimensões do envelhecer como um processo. Nesse contexto, a Secretaria de Vigilância em Saúde em 2005 reproduziu o documento “Envelhecimento Ativo – Uma Política de Saúde”, material informativo e de suporte técnico à mobilização da sociedade para a promoção da saúde, elaborado pela Unidade de Envelhecimento e Curso de Vida da Organização Mundial de Saúde (OMS) como contribuição para a Segunda Assembleia Mundial das Nações Unidas sobre Envelhecimento realizada em abril de 2002, em Madri, Espanha, com o objetivo de dar informações para discussão e formulação de planos de ação que promovam um envelhecimento saudável e ativo que serviu de embasamento e propulsão para a aprovação da PNSPI no Brasil que ocorreu, como já citado, meses após a divulgação desse documento (WHO, 2005).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (2005: 13) entende que o “Envelhecimento ativo é o processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas”.
Também define a palavra “ativo”:
refere-se à participação contínua nas questões sociais, econômicas, culturais, espirituais e civis, e não somente à capacidade de estar fisicamente ativo ou de fazer parte da força de trabalho. As pessoas mais velhas que se aposentam e aquelas que apresentam alguma doença ou vivem com alguma necessidade especial podem continuar a contribuir ativamente para seus familiares, companheiros, comunidades e países. O objetivo do envelhecimento ativo é aumentar a expectativa de uma vida saudável e a qualidade de vida para todas as pessoas que estão envelhecendo, inclusive as que são frágeis, fisicamente incapacitadas e que requerem cuidados (WHO, 2005:13).
Dessa forma, o documento propõe o entendimento do conceito de saúde ampliado e multifatorial para além do aspecto de ausência de doenças e considera as questões estruturais básicas como renda, habitação, emprego, educação, entre outros. Essa proposta é extremamente necessária e oportuna, pois possibilita a participação ativa do idoso no movimento de construção e efetivação das leis e políticas sociais e de saúde que viabilizem o viver e envelhecer com qualidade. A voz dos maiores interessados precisa ser ouvida, para que as reais necessidades sejam adequadamente identificadas e incorporadas às novas práticas de saúde. Assim, as propostas que visam a abordagem dos três pilares do envelhecimento ativo: saúde, participação e segurança, elencadas pelo documento, são bem-vindas.
No Brasil, ao longo do processo de implantação e implementação das políticas de atenção à saúde ao idoso, embora lenta e gradativa, possibilitou maior suporte na garantia de direitos a essa população, permitindo transformações no olhar para o entendimento de que a velhice deve ser considerada como um ciclo da vida e não como uma doença, sobretudo torna-se necessário compreender que o processo do viver envelhecendo, de conviver com intercorrências, as quais podem ser evitadas e, em especial, tratáveis. As ações destinadas à saúde dos idosos, implicam o compartilhamento de responsabilidades com outros setores. Nesse intuito, é imperativo que os gestores do SUS estabeleçam processos de articulação permanente em suas respectivas esferas de abrangência, com o objetivo de constituir parcerias e integração institucional que favoreçam a concretização de compromissos multilaterais efetivos quanto ao avanço das políticas de atenção à saúde do idoso.
Considerações finais
O artigo tem por objetivo refletir sobre o processo de envelhecimento no mundo contemporâneo, considerando que, devido a alteração demográfica de pessoas na “terceira idade”, onde a prospecção de aumento para as próximas décadas seja de crescimento, levando em consideração que isso se deve as melhorias das condições de vida e ao avanço da medicina, no entanto, ainda se percebe graves problemas de ordem primária, como a pobreza de grande parte da população, gerando processo de vulnerabilidade social, principalmente para as pessoas idosas.
As transformações percebidas na atualidade se devem principalmente pelo avanço tecnológico e econômico que implica no crescimento demográfico populacional. No Brasil, nas próximas décadas esse crescimento pode chegar a triplicar em três décadas e já é considerado o país que a maior população idosa. Dessa forma é preciso pensar de que forma será tratada essas pessoas no processo de envelhecimento no tocante ao acesso as políticas públicas, seja para aqueles que chegam nesse período da vida com saúde e alguma renda, mas principalmente para aqueles que, ao entrar na “terceira idade” não conseguem acessar as políticas públicas, principalmente a previdência social, visto que é contributiva e muitas pessoas, não puderam ao longo da vida, ter a segurança de reserva financeira e se veem desamparadas e sem condições de se sustentar para ter qualidade de vida.
Há também a preocupação em relação a essa parcela da população que, sem saúde e sem renda fica refém dos cuidados da família e muitas vezes é colocada na posição de “fardo” no contexto familiar, sofrendo violência doméstica como a negligencia, insegurança alimentar e afetiva. Em alguns casos e de forma muito corrente, se opta para as Instituições de Longa permanência, subsidiadas pelo Estado, mas acabam sendo relegados ao esquecimento e com isso o desconforto da solidão e sem poder viver as relações familiares e sociais de fora da instituição. Havendo, por outro lado aqueles que mesmo com alguma renda, já não se sentem bem no convívio familiar e desejam viver a vida com autonomia e resolvem viver em comunidades para assim se sentirem felizes e ter qualidade de vida social e afetiva.
Muito se tem discutido sobre o processo de envelhecimento no Brasil, no entanto, ainda é preciso fazer valer a legislação existente no país para a proteção de pessoas idosas, pois mesmo sendo da década de 2000, não se tem efetividade na execução da mesma para garantir o acesso as políticas públicas de forma eficaz, denotando que essa parcela da população teve relativa atenção apenas pelo fato de implicar fatores econômicos ao país. Dessa forma, é preciso avançar nas pesquisas sobre a temática para provocar a proteção prevista na legislação e mobilizar a sociedade para a necessidade de cuidar de seus idosos.